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Calça os meus sapatos, não caminhes com eles

O mundo ideal é aquele em que não precisamos de justificar nada a ninguém. Nem a velocidade a que conduzimos, nem a nossa opção por um copo de água. A desnecessidade de darmos explicações, mesmo àqueles que nos são mais próximos, é, pois, um reflexo de sintonia e conexão. É isso que a empatia traz. Envolvimento e sensibilidade para compreendermos medos, tristezas, alegrias, escolhas e, sim, também a ignorância, a agressividade e… a falta de empatia.


Volta e meia, a dúvida bate-me à porta. Porque motivo há ódio e divisão social? Numa tentativa de encontrar a explicação certa, lanço a primeira hipótese: “interesses discordantes”. Mas uma reflexão mais profunda leva-me a acreditar que não pode ser; que isso não pode bastar. Eu proponho que os conflitos entre pessoas e sociedades têm origem na mente humana. E, se me perguntarem “como?”, respondo sem pestanejar: falta de empatia.


Muito sucintamente, a empatia é a capacidade de vermos o mundo da perspetiva de outra pessoa; de conseguirmos experienciar - sentir - emoções de terceiros. Aí está. Uma linha e meia basta para explicar algo que é gratuito, mas longe de ser uma realidade coletiva.


A falta de empatia é um diagnóstico desfavorável à vida em comunidade e os sintomas aparecem um pouco por toda a parte: na autoestrada, quando buzinamos ao condutor da frente por conduzir a 30 à hora - o condutor dominado pelo nervosismo por estar a pegar no carro pela primeira vez depois do exame de condução; no restaurante, quando reclamamos com a demora do empregado - o empregado que começou a trabalhar no próprio dia e está em fase de aprendizagem; no seio familiar, quando, na festa de aniversário, apontamos o dedo ao primo que quer beber água e não a Coca-Cola - o primo que só quer satisfazer a própria vontade e é julgado por isso. Não haveria, acreditem, fôlego (palavras) para expor todos os exemplos possíveis, sejam eles mais ou menos descabidos.


O mundo ideal é aquele em que não precisamos de justificar nada a ninguém. Nem a velocidade a que conduzimos, nem a nossa opção por um copo de água. A desnecessidade de darmos explicações, mesmo àqueles que nos são mais próximos, é, pois, um reflexo de sintonia e conexão. É isso que a empatia traz. Envolvimento e sensibilidade para compreendermos medos, tristezas, alegrias, escolhas e, sim, também a ignorância, a agressividade e… a falta de empatia. Entendem onde quero chegar? Um exemplo ao estilo dos que já apresentei pode clarificar. Nós censuramos a pessoa sem empatia por revelar insensibilidade; por ser intransigente - a mesma pessoa que ainda não teve a possibilidade de se instruir ou de se debruçar sobre este assunto. Sobre o ser empático.


Vejam na empatia um músculo que precisa de ser trabalhado. Todos temos o potencial para suceder nesse exercício. Mas, antes de compreendermos os outros - antes de sentirmos com os outros - precisamos de explorar os nossos preconceitos; precisamos de reconhecê-los e de desafiá-los. Esse é o primeiro passo para uma mente mais aberta e mais saudável. Em muitos casos, aliás, ser empático não significa sequer saber usar as palavras certas, mas ter apenas a capacidade de ouvir e de se ligar ao próximo.


Saibam, de qualquer modo, que o gesto empático não é uma palmadinha nas costas; não se trata de ouvir ou de se conectar às pessoas de um modo forçado. É sempre um meio para assimilar pontos de vista e decisões diferentes, sem que isso represente para nós uma ameaça. Não, para sermos empáticos, não precisamos de mudar, ou de desvirtuar as nossas crenças. Precisamos, sim, de arranjar a motivação para ver o mundo de outra lente. Se assim for, podemo-nos orgulhar de estar a aperfeiçoar a nossa identidade e a ampliar o nosso conhecimento. Lembrem-se sempre: calcem os sapatos dos outros e fiquem por aí. É suficiente. Para caminhar, usem os vossos.




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